quinta-feira, abril 12, 2007

1 e 2 por Srta. Jones

"Há quanto tempo nós chegamos aqui?"

"Já deve fazer algumas horas, eu acho."

"Tanto tempo assim?"

"Um-hum."

"É... é mesmo. Deve ter umas... três, quatro horas?"

"Acho que mais."

"Mais?"

"É. Umas sete horas."

"Tudo isso?! Meu Deus. E o que a gente fez aqui esse tempo todo?"

"Nada."

"Nada?"

"É, nada."

"Caramba. Tanto tempo perdido pra nada. Tem certeza que a gente não fez nadinha mesmo?"

"Um-hum."

"Puxa vida."

"É."

"Teve aquela hora em que a gente assistiu à tv. Lembra?"

"Lembro. Mas foi pouco tempo."

"Quanto?"

"Uns quarenta minutos, mais ou menos."

"E depois a gente fez o quê mesmo?"

"A gente ligou pro cara do aquecedor, ele não atendeu. Depois a gente jantou, aí sua mãe ligou e você falou com ela durante cinco minutos, e enquanto isso eu lixei minhas unhas."

"E depois?"

"Depois a gente ficou lendo o jornal, procurando alguma coisa pra fazer. E só."

"Então... quer dizer que a gente passou esse tempo todo procurando o que fazer, foi isso?"

"É, acho que sim."

"Nossa. Que desperdício."

"Também acho."

"Da próxima vez a gente não vai perder tanto tempo. Se não surgir nada pra fazer, a gente inventa, nem que seja um baralho ou uma sinuca, ou um livro, sei lá."

"Não vai ter próxima vez, pelo menos não esta semana."

"Ué, por quê não?"

"Porque amanhã você trabalha, e depois de amanhã também, esqueceu?"

"Ih, é mesmo. Não é que eu tinha esquecido?"

"É, deu pra perceber."

"Poxa, que pena. Bom, pelo menos a gente se encontrou e colocou a conversa em dia."

"A gente quase não conversou."

"Sério?"

"Sério."

"Meu Deus. Quanto tempo perdido."

"É."

"Bom, mas pelo menos semana que vem a gente vai se ver de novo."

"Se eu estiver por aqui."

"Você não vai estar?"

"É provável que não. Eu viajo no sábado e não sei quando volto."

"..."

"..."

"Bom, então eu já vou. Me liga quando você voltar. Boa viagem."

"Obrigada. Até."

"Até."

terça-feira, abril 10, 2007

Cromossomo X por Srta. Jones

Elas caminham como se não se importassem se estão sendo olhadas ou não, mas na verdade elas se importam. Elas são mulheres que fazem gênero.

Elas usam minissaias e seguram os cigarros na ponta dos dedos. Elas são mulheres que fazem gênero.

Quando estão numa boate, dançam de olhos fechados e lentamente, como se todos as atenções devessem se voltar somente para elas. Elas são mulheres que fazem gênero.

Quando querem seduzir um homem, caminham dançando em sua direção como se fossem a mulher mais incrivelmente sexy do mundo. Elas são mulheres que fazem gênero.

Quando saem em grupo com as amigas, exageram nas insinuações de homoerotismo. Elas são mulheres que fazem gênero.

Elas se esforçam para parecem sempre blasés, mas nunca querem deixar de ser notadas. Elas são mulheres que fazem gênero.

Elas se auto-definem como "muito complexas" e dizem odiar todos os rótulos. Elas são mulheres que fazem gênero.

Elas alimentam o sonho de um dia serem exatamente como Scarlett Johansson, trejeitos, caras e bocas. Elas são mulheres que fazem gênero.

Quando saem à noite, é a elas que todos os homens perdidos se dirigem. Elas são mulheres que fazem gênero.

segunda-feira, abril 02, 2007

Um dia, alegria por Srta. Jones

Ele sempre tinha uma história para contar. Não era fácil ser ele. O tempo todo, todos os dias e anos, pensando e criando e enlouquecendo as pessoas com suas idéias. Ele não era um santo.

Suas crias nos fizeram pensar. Mais do que isso, nos fizeram sentir. Não tinha como alguém não se empolgar diante de tanto entusiasmo, loucura e arte. Só ele conseguia disso. E ele nunca nos decepcionou.

Seus momentos foram aparecendo e se tornando cada vez mais freqüentes e duradouros. Ele era dono de sua obra e ninguém poderia fazer como ele. Era inimitável e merecedor de cada segundo de adoração que atraía. Podia-se dizer mesmo que era um gênio. Mas os gênios sempre vivem por muito tempo.

Com ou sem uma musa, sua arte seria igualmente bela, simples, elétrica e subestimada. E ele sempre fez mais. Hoje mais do que ontem, e assim foi até o dia em que ele não pôde mais. Justamente no momento em que todos se perguntavam: "e agora, do que mais ele é capaz?"

Sempre tão compenetrado, sempre sendo a alma da sua criação. Sempre sorrindo, ou mascando um chiclete. Às vezes de óculos escuros, e algumas mechas caindo sobre os olhos. Sempre um artista, no sentido mais puro e idealista e menos vulgar do termo. Um dia ele teve de ir. Eu só soube três dias antes. Mal tive tempo de me despedir.

Espero um dia vê-lo de novo. Até lá, dançarei todas por você, meu querido.